domingo, 4 de outubro de 2015

Uma canção para nosso amor

Fanha e errante sua voz se espalha. Como um chiado agudo e melódico, meus ouvidos se acostumam à sinfonia. O microfone capta os graves quase inaudíveis e incorpora ao seu timbre genuíno. Será esta a voz que me despertará para a manhã voraz? Será este o som que eu ouvirei quando estiver muito nervoso para levantar da cama? Que melodia mais sublime. Como uma canção, ouço-a repetidas vezes. O áudio se repete quase que instantaneamente dizendo sempre as mesmas palavras vorazes: “Não posso casar com você.”

É estranho ouvir essa música. Sua voz, tão melodiosa, não parece me dizer nada além de notas escaladas em tons de Ré. Não consigo entender o que me dizes, pois existe uma melodia tão sublime por trás de cada fonema que torna impossível concentrar-se em um sentido para seus dizeres. Mal consigo lembrar-me do meu pedido desajustado. O que mais eu poderia fazer? Você me tomou em uma surpresa intransponível, meu estado de choque era imutável e inconcebível. Quando te vi na rua, dizendo coisas, eu acreditei em fadas, em sereias, em feitiços. Eu acreditei em um amor.

Desculpe-me, sinceramente se eu lhe causei algum pânico. Eu sei que... Bem, você estava parada na rua, falando. Eu fiquei sem ação. Tudo bem, que você estivesse falando no celular, mas eu senti que aquelas palavras eram para mim. Quando você disse aquilo sobre “não se preocupe, eu volto em quinze minutos”, eu entendi o que você queria dizer com isso. Eu entendi que você nunca sairia do meu lado por mais do que um quarto de hora. Eu compreendi cada palavra que você me disse.

Quando você falou: “a lasanha está no forno, é só esquentar no microondas”, eu entendi que era um aviso de que você cuidaria de mim e eu prometi silenciosamente que cuidaria de você também. Mas, admito, tive medo de que você partisse. Então me aproximei. Eu queria que tudo fosse perfeito. Queria que eu e você pudéssemos recordar as exatas palavras que selariam nosso amor. Por isso, liguei o gravador e me aproximei. Quando eu lhe disse que se casasse comigo, foi sincero cada dizer. Foi honesto cada suspiro.


Você me respondeu e partiu, como eu temia que acontecesse. Eu fiquei ali, deixado, sem entender de nada. Como poderia um amor tão certo desaparecer assim, sem motivo? De todo caso, não guardo tristeza, mas, preservo a ternura de ouvir teu timbre no meu radinho, antes de dormir. Algo de bom aconteceu no nosso encontro, e eu sei que marquei a sua vida também. Você deixou para mim o maior presente que alguém poderia deixar, você me deixou aquela música, aquela poesia musicada do início ao fim, aquelas doces e maravilhosas palavras, que insistem em me dizer que você nunca será minha. Tolinhas, eu sei que você vai me procurar.


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