- Vamos lá
crianças, não podemos perder mais tempo!
- Rápido
Jonas!
Sério? Meu
pai inventou este passeio ridículo pra essa cidade abandonada. Por que eu
pareço o único que não está empolgado com isso. Meu irmão está agitado desde
ontem, e eu realmente não vejo o porquê. Meu pai já me levou lá quando eu tinha
5 anos. Ele ficou umas duas semanas falando que a gente ia, e quando finalmente
fomos, eu fiquei muito desapontado. É só um grande campo coberto de neve e
ruínas do que um dia já foi um vilarejo.
- Jonas, nós
vamos chegar atrasados! – meu irmão realmente estava começando a me irritar.
- Rafa,
deixa eu te contar um segredo... – Ele chegou mais perto da minha boca,
esperando ouvir algo interessante – Não vai ter ninguém lá. Sem fila de espera.
Não precisamos correr.
Ele olhou
pra mim com uma cara que dizia “Deixa de ser chato” e desceu as escadas me
puxando violentamente.
Quando
entramos no carro, meu pai começou a recontar a velha história da cidade de
Hamkoff, onde estávamos indo:
-... As
pessoas viviam tristes, fazia muito calor. Um dia, misteriosamente, começou a
nevar, e a cidade virou uma grande pista de patinação de gelo. As pessoas
patinavam toda hora e viviam felizes e sorridentes.
- E o que
aconteceu pai?
Meu irmão
realmente estava dando ouvidos ao velho.
- Depois de
um ano, as pessoas perceberam que não faziam nada além de patinar e patinar.
Não comiam, nem dormiam... Estavam hipnotizados, mas felizes. O problema é que
quando não se come nem faz as necessidades para regular o corpo direitinho, as
pessoas começam a passar mal. Ficaram quase todas doentes. Mas ainda assim
estavam patinando felizes. A primeira pessoa a morrer foi uma senhorinha,
morreu com um sorriso enorme no rosto. Não houve velório, as pessoas passavam
por seu corpo jogado na pista e sorriam por ver a cara alegre e sem vida da
senhora. Pouco a pouco, a cidade inteira começou a morrer, felizes da vida...
Ou da morte. Até que não sobrou ninguém.
Quanta
besteira.
- E a cidade
é cheia de esqueletos pai?
- Claro que
não. As pessoas morriam tão felizes e com uma alma tão alegre, que subiam aos
céus, virando estrelas.
- Jura pai?
Ah, que
saco. Será que ele não entendeu que é tudo uma historinha sem graça?
- Jonas...
Você viu as estrelas quando foi lá?
- Não Rafa.
Não tinha nada.
Meu pai
olhou pra mim com reprovação.
Depois de um
bom tempo no carro, finalmente chegamos a cidade de Hamkoff. Meu irmão desceu
do carro as pressas para ver as estrelas.
Porém, assim
que saiu do carro, fez a mesma cara que eu tinha feito há doze anos atrás. Cara
de quem estava tomando um picolé na praia até que o sol veio e jogou tudo no
chão.
- Onde estão
as estrelas pai?
- Ali meu
filho! – meu pai apontou pra um lugar qualquer no céu.
Eu pensei
que havíamos desperdiçado a noite, quando uma garota realmente bonita chegou
perto de mim enquanto meu pai mostrava a cidade pra Rafael.
- Oi. Você é
novo por aqui?
- Sim. Meu
nome é Jonas.
- Eu me
chamo Alice. Você está afim de patinar
um pouco?
- Ah, claro.
A garota
então pegou dois pares de patins e entregou um a mim. Depois de um tempo
patinando, me surgiu uma dúvida.
- Você está
sozinha?
- Não. Estou
com você.
- Ah... Você
é de onde?
- Lá de
cima.
- Do norte?
Tipo Canadá?
- Não. Eu
vim lá de cima mesmo. – a garota apontou para o céu escuro. Eu estava começando
a me assustar. Espera aí? Escuro?! A gente chegou a tarde.
Eu procurei
meu pai e meu irmão com os olhos e não achei. Onde estavam?
Pensei em
sair e procurar, já deviam ter passado horas. Estava quase amanhecendo de novo.
Por que eu não sentia vontade de sair?! Por que aquilo era tão bom?
Eu acho que
fiquei anos por ali. Até ver Alice sumir do nada. Mas eu continuava feliz. Me
sentia incrivelmente feliz.
Não notei
quando a fome começou. E nem quando meus pés saíram do chão.
Nenhum comentário:
Postar um comentário