Essa é uma história um pouco diferente da que a maioria das pessoas
conhece. Ainda assim, é a história do Soldadinho de Chumbo. Tudo começa quando
uma grande marca lançou uma nova coleção de soldadinhos de brinquedo que ganhou
rapidamente a atenção e popularidade entre as crianças da época. O nosso
soldado era um exemplar de uma dessas coleções e, ao contrário do que parece,
não lhe faltava nenhuma perna. Não lhe faltava nada que fosse feito de chumbo.
Ele e seus 24 irmãos foram o presente de aniversário de um menino que
tinha entre 10 e 11 anos. É claro que ele não era um menino qualquer, e sim um
menino egoísta de família rica que estava sempre ganhando brinquedos novos
porque sempre acabava destruindo os seus. O menino arrumou os soldadinhos em
uma estante perto da janela, um ao lado do outro, em seu quarto de brinquedos.
Mais tarde, quando todos da família já haviam ido dormir, os brinquedos do
quarto despertaram e foram conhecer os novos companheiros e alertá-los do
comportamento de seu novo dono. Os soldados perceberam que muitos brinquedos
estavam de fato danificados, rasgados ou sujos.
Os soldadinhos aproveitaram que ninguém estava acordado pra conhecer a
grande casa onde iriam morar a partir de então. Nosso soldado, no entanto, por
ser o último da fila, se distraiu com os quadros na parede e acabou se
perdendo. Observou alguns vultos em uma das portas próximas a ele e, ao se
aproximar, viu que havia uma bela bailarina de papel dançava graciosamente sob
a luz do luar. A bailarina só tinha uma perna e isso tornava sua dança ainda
mais incrível. Não se sabe quanto tempo o soldado ficou a observar a bailarina.
Quando estava prestes a amanhecer, uma voz o advertiu para que voltasse para o
quarto; era um palhaço, que se ofereceu pra guiar o soldado de volta até o
quarto. Ele, é claro, aceitou sem hesitar, pois reconhecia o perigo de estar
fora do quarto quando os humanos da casa acordassem.
No caminho de volta, o palhaço contou ao soldado que não deveria entrar
no quarto onde viu a bailarina, pois pertencia à irmã mais nova do menino. Além
disso, ele não tinha permissão de entrar lá por causa dos seus cuidados com os
brinquedos. O soldado concordou que isso poderia trazer problemas, porque se um
dos brinquedos do menino fosse visto no quarto de sua irmã, ele estaria em
apuros. O palhaço lhe garantiu que só estava inteiro porque o menino tinha medo
de palhaços e nunca brincava com ele. Por esse mesmo motivo, era rejeitado pelos
outros brinquedos. Quando estavam se aproximando do quarto, o palhaço disse ao
soldado que era melhor esquecer a bailarina, pois jamais poderiam ficar juntos.
O soldado retornou ao seu lugar ciente de que já estava apaixonado.
Os dias passaram, e o soldado ia todas as noites assistir a dança da
bailarina. Ela sabia que ele estava lá, mas parecia não se importar; não de uma
maneira arrogante, e sim porque parecia estar acostumada com isso. Uma bela
noite, o soldado estava indo assistir sua amada e ouviu alguns barulhos. Ele viu
a luz do banheiro acesa e ao se aproximar percebeu que o menino estava jogando
alguns brinquedos no vaso sanitário e dando descarga. O menino percebeu a
presença de alguém e olhou para trás. O soldado teve que se jogar no chão e
parar de mover para que não fosse visto. O menino o pegou, olhou por alguns
segundos como se estivesse se questionando do porquê do soldado estar ali.
Resolveu jogá-lo no vaso e deu a descarga.
O soldado perdeu a consciência e quando se recuperou, estava no esgoto,
ao lado de muitos pedaços de brinquedos que ele outrora achou que fossem
brinquedos inteiros. Andou, andou e andou. Não sabia aonde estava indo. Não
sabia nem ao menos se estava indo para algum lugar. Só conseguia pensar na
fantástica bailarina de uma perna só. Foi quando teve a ideia de bater com seu
corpo de chumbo nos canos a sua volta para chamar a atenção de alguém e pedir
ajuda. Após bater algumas vezes, ouviu barulhos a sua volta. Uma grande besta
com olhos saltados de cor escura se aproximou de maneira assustadora. Era um
rato de esgoto, desses bem grandes. O rato negou o pedido de ajuda e tentou
devorar o soldado. Porém, como ele era sagaz, entrou em um dos menores canos,
onde o rato não poderia entrar. O rato fez uma proposta perigosa em troca de
sua ajuda. Reconhecendo que não havia outra escolha, o soldado se dispôs a
ouvir o que ele tinha a dizer.
O rato contou que sabia de onde o soldado viera, pois devorava todos os
restos de brinquedo que o menino jogava no esgoto. Para ajudar o soldado a
voltar para a casa do menino, o rato queria um pedaço dele. O soldado,
soterrado no medo de nunca mais ver sua amada, aceitou o pedido com uma
condição: ele teria o direito de escolher o pedaço que daria ao rato. Ele escolheu
sua perna direita, sem pensar muito. Sim, esta era a mesma perna que a
bailarina não tinha. Ele achou que de algum modo estaria mais próximo dela dessa
forma. Achou que ela o aceitaria se percebesse que eles tinham isso em comum. O
rato roeu a perna do soldado, o encaixou entre as presas e saiu rapidamente em
direção à saída do esgoto. Em pouco tempo, chegaram do lado de fora do esgoto.
O soldado, mesmo tendo que entregar uma perna em troca da ajuda, agradeceu ao
rato que já não podia ouvir ou ver o soldado.
No fim da manhã seguinte, o menino tomou um susto ao ver que o único
soldadinho que faltava, já que ele havia se desfeito do mesmo, havia voltado e
estava sem uma das pernas. Ele começou a chorar e gritar coisas das quais não me
recordo. Ele estava tão assustado que, sem pensar muito, pegou o soldado com
cuidado, saiu correndo e o jogou na lareira que estava aquecendo a casa em mais
uma manhã fria de inverno. Nem deu chance ao soldado para se despedir de seus
amigos ou de assistir uma última dança de sua amada. O soldado que havia
sobrevivido ao esgoto e a terrível besta que ali morava, aos maus tratos do
menino e até mesmo ao amor platônico que sentia pela bela bailarina, encontrou
o fim de sua vida.
Ele não teve chance de confessar seu amor nem de ouvir mais piadas de
seu amigo palhaço. Nada. Sucumbiu perante um dos expoentes mais imprevisíveis
da natureza humana, o medo.
Ando tão reflexiva e após ler essa história, fiquei triste, com a crueldade do ser humano!! sniiiifffff!!!!!
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